sexta-feira, 4 de agosto de 2006

Marília

Marília estava apenas sentada, olhando o céu, as estrelas, as nuvens. Estava apenas sentada olhando o nada. Cega. Marília estava cega, olhando tudo que a rodeava. Marília, garota cega, enxergando o nada que a envolvia e as estrelas de um céu nublado. Gostava de restar assim: olhando o nada e o tudo que a rodeavam, sem ver coisa alguma, cegamente apreciando o mundo que se desmoronava ao seu redor. Enxergava muito mais que os garotos que se sentavam ao seu lado, naquele banco velho e descascado, naquele jardim sujo com vista para o nada. Os garotos que a enganavam. Os garotos que desistiam. Os garotos que nunca terminavam uma história, iam embora e ficava Marília. Só. Cega. Sem querer enxergar, e, quando o quis, lhe foi vetado o direito.

Marília estava lá, todos os dias. Mantinha-se cega. Marília não via o jardim sujo. Marília não via o banco velho e descascado; e o nada era um grande céu estrelado, com nuvens esparsas, anunciando uma neblina logo mais, na madrugada. Era a idéia perfeita de madrugada: o sol e a lua no mesmo firmamento, ainda que distantes, e uma neblina suave que envolvia todo o ar com o orvalho e uma névoa fina e fria. Era a idéia perfeita da madrugada que Marília nunca vira. Marília nunca verá essa madrugada. Marília a cria em suas idéias e é feliz assim, não é mentira! É a realidade que ela criou para si. Não é ficção! É a realidade que ela não pode ver, lhe foi tirado esse direito, assim como o lindo jardim florido com vista para um enorme campo de tulipas onde ela se senta todos os fins de tarde, em seu banco envernizado, com adornos que ela criava em sua mente. Tudo era criação de sua mente.

Um jardim perfeito, uma Marília perfeita, em seus sonhos estelares, em suas nuvens esparsas e neblinas suaves pela madrugada. Mesmo sozinha, em seu banco envernizado. Sozinha. Cega. Marília.


Ainda assim era tudo perfeito. Ironicamente perfeito.

11 comentários:

Anônimo disse...

Marilia...
Olhas para o nada e nada vê
Senta-se no nada e ali não está
Falam-lhe tudo e nada ouve

Marilia...
Qual seria o significado?
Qual seria o destino?
Qual seria a palavra?

Marilia...

Rafael Castelo Branco de Oliveira Torres disse...

A Marília dá bola demais pro que os velhos que jogam dama na praça falam... Eles são só velhos...

Mas já pensou no que é a realidade? O que Marília realmente crê ser real?

Não importa...

A minha realidade é cinza, ou verde, ou alvinegra... Ela muda costantemente, mas nunca sai desses três tons. Fora os momentos em que toca Black...

Anônimo disse...

vou te dar um toque...
entra no site www.overmundo.com.br!
beijooooooooo...
adorei!

Anônimo disse...

Foi uma das melhores crônicas (???) que eu li sua! Mto boa, viu! Todos nós temos um pouco de Marília, né?! Pode crÊ!

Ps: Bek, please, não me faça passar vergonha... "enxergando" é com 'X'.

Anônimo disse...

Ô.õ Marília tem um gosto peculiar pra tudo...

Anônimo disse...

Olá!!!

Eu tenho uma amiga Marília... só que ela não é cega... :P

como sempre bem escrito... e eu enxerguei (ou encherguei???) uma analagia a uma pessoa nesse texto... e isso me deixa preocupado com essa pessoa porque eu gosto muito, mas muito mesmo, dela...

bjos!

Anônimo disse...

Eu entendo +/- pelo q a MArília passou e tah passando na vida dela, mas nao entendo seus perspectivas...
tipo, eu acho q existe o tao sonhado jardim e o banco de Marília, q ela vislumbra tanto.
Nao acho q ela deva pensar q apenas um sonho, q eh impossivel.
Tenho certeza q ela eh bem mais forte para correr atras desse sonho, assim como ela ja fez com outros...
neh, Xica Rebeca de Lima Xavier?
;********~
Marilia precisa eh de um colirio pros olhos! huahiuohhauea... ;P
;X
Saudades da Mar...da maninha! ;*****

Anônimo disse...

bonito. :)

Anônimo disse...

A vida pode se demonstrar de fárias formas desde que vc queira vê-las e desde que vc pense sobre o ângulo no qual vc a olha...
Chero Nega muito bom esse seu texto...
Cada dia se torna um prazer maior em estar contigo.

Anônimo disse...

Lindo. De verdade. É de uma simplicidade assustadoramente real.

;*******

Anônimo disse...

Nem mesmo realidades fictícias são perfeitas.


Marília deveria se dar conta de que a lua e o sol interagem o tempo todo, e não só na madrugada.

Marília deveria se dar conta que cegar-se na escuridão é muito mais proveitoso. Ver o nada, o breu...

Marília deveria não estar lá todos os dias. Não cair na rotina.

Marília deveria se dar conta de que ela nunca não vê as mesmas coisas. Essas coisas, aparentemente sempre iguais, sempre mudam, desbotam, descascam, morrem, crescem.

Marília só finge que é cega.


E ela sabe que nada é perfeito...

Histórico


as primeiras ideias...