segunda-feira, 13 de julho de 2009

A insustentabilidade de um refluxo.


Afinal de contas tudo o que sabemos acaba por ter de ser desconstruído para que possamos capturar todas as novas informações que nos são lançadas todos os dias. Quando entrei para a faculdade de Letras, na UFC, descobri que deveria apagar de minhas anotações mentais tudo o que havia aprendido sobre gramática porque estava prestes a conhecer um universo de desvelações que poriam por terra as tantas regras sem sentido que tive de decorar (claro, muito tempo depois, descobri que nunca deveria ter feito essa formatação de minha mente). A verdade é que duas afirmativas opostas não só podem se completar como frequentemente o fazem, sem parar para pensar nas consequências, em tudo e em todos que estão envolvidos, é uma relação de amor-ódio que se basta. O que é gramática, para que serve a gramática, qual é a melhor, normativa, funcional oh meu Deus!, e a poesia então? Depois de tantas e abstratas ideias aprendidas foi necessário fingir que de nada sabia ou que em nada acreditava para que eu pudesse aceitar que não era apenas aquilo, que aquilo poderia ser falso, que os versos poderiam ser parágrafos, que, na verdade ela poderia ser um desobjeto, despenteado, lavado e polido tantas mil vezes e esquecido e retomado apenas na penumbra, deixando que o escuro trouxesse as visões de muitas cidades e povoações. São tantas vozes que me gritam e o Drummond que não quer acender a luz quando escurece para que possa sentir uma paz não tão destroçada e a alma suave. E os médicos que me dizem, fique calma, não devaneie, tente manter-se no chão. Como? sem receita, sem indicações, sem direcionamentos. Há em todos os lugares pessoas e pessoas e acontecimentos e idéias – boas ou péssimas – que vem que vão que passam e que simplesmente existiram; há livros e filmes e quedas de símbolos de opressão; e há a insustentabilidade de manter-se o mesmo, de pretender que nada realmente foi lá no cume de sua sensibilidade tornando-o o mesmo e insustentavelmente o outro; tornando-o o próprio paradoxo, o simulacro de si. Podemos ignorar os fatos? Renegar os livros? Dissimular os filmes? A arte? A solidão? Cadê a solidão de um pensamento que não se concretiza, é necessário que tudo esteja fechado e lacrado e finalizado? A vida não segue então um curso dinâmico de mudanças, caminhos, construções. Desculpe, sim, segue, digo isso no começo do que digo. No fundo, no final e superficialmente surge o mesmo questionamento que sempre foi e que continuará sendo: é o homem um ser social, de fato? Não posso falar por toda a sociedade, mas posso falar por mim, neste momento, neste instante em que estou aqui, escrevendo todas essas coisas sem sentido: sinto a necessidade de ficar só dentro de mim para desconstruir a ideia que sempre fiz de poesia, preciso me perder dentro de meus milhares de botões para compreender que a reação do outro não é necessariamente aquilo que eu interpretei que fosse e preciso estar no meio do riso fácil e do papo furado para entender que o paradoxo é o sal da existência. Sempre precisei. A confusão de desejar duas coisas diametralmente opostas me torturava e nem sequer me saía da boca. O psicólogo sempre perguntava você tem algo para me falar e eu nada dizia. O que dizer? quero estar só e acompanhada ao mesmo tempo e em tempos diferentes, preciso estar ao lado de alguém mesmo que platonicamente, mesmo que esquizofrenicamente mesmo que de uma voz escrita cantada em notas sentidas e não desenhadas.

Foi então que uma muito estimada e, talvez, para sempre perdida pessoa me indicou essa páginas. Páginas que já tinha em minha estante a muitos anos e que nunca tinha querido ler por não conseguir compreender-lhe o nome: A Insustentável Leveza do Ser, como? por que? como uma leveza pode ser insustentável? Não é necessária força alguma para se erguer um algo que é leve, que é tranquilo, que é passivo, que é digestivo!

Minha vida de leituras se divide em antes e depois e A Insustentável Leveza do Ser de Milan Kundera. Se não o de mais forte impressão, foi o livro que me abriu os caminhos para começar a compreender que a vida é solitária e não porque estejamos sozinhos no mundo mas porque o mundo precisa que nós estejamos sozinhos para saber interagir com os outros, e ninguém nunca aprende. Que na vida estamos em sociedade e que precisamos do outro para construir nossa própria solidão. A complexidade de ser. Um dos livros mais belos que já li e que mostra, através de sonhos e de leituras individuais de um mesmo acontecimento partilhado, a distancia que há entre uma e outra pessoa, a distancia que há entre você e o outro que você se torna. E a beleza maior está no vencer um preconceito, porque foi assim que eu cheguei à beleza deste livro de Milan Kundera.

A Insustentável me assanhou os pensamentos e as emoções mostrando como a facilidade e a boa digestão podem ser as principais causas do bichinho do crãcrã e da ruminação constante das minhas ideias e contradições.

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