terça-feira, 20 de março de 2012

A música


Tinha uma música abafando o sons do dia e, por trás da música, tinha risos que escondiam um segredo num diário fechado debaixo da cama; que, cúmplice do diário, escondia as molas fracas e as marcas no colchão e, passeando por tudo isso, pela música, pelos risos, pelo segredo pelo diário pela cama pelas molas fracas estávamos eu e meus gritos.

Tinha também um cachorro preto que, acho, me questionava sempre, tudo, mas nunca obtinha resposta, pobre do cachorro. Para ele, também, acho, a música existia naquela manhã abafando o som do pão no desjejum. Para ele, acho, naquela manhã, a música também abafava os sorrisos e os segredos e os diários e as camas e as molas fracas da casa toda porque ele me questionava.

Eu tinha dois olhos vivos fixados em mim e, bruscamente, sentia o som do dia novo, que descia meu corpo e se alojava na fralda, sem qualquer amparo meu, ou de meus gritosgemidosmúsicas.

E, por fim, tinha a minha mulher.

Éramos, então, eu que gritava, a música que abafava o som da manhã, o cachorro que questionava e a mulher. Para quem, acho, havia a música naquela manhã, que escondia as molas fracas do segredo cheio de sorrisos no diário debaixo da cama perdida no meio de sua manhã atribulada.

A mulher, que era minha, ouvindo meus gemidos, vinha ver o que eu queria e me passar o relatório da rua. Eu não queria. Não que tivesse escolha, mas eram muitas informações e eu me concentrava muito fortemente em controlar meu corpo. Que gemia.

E a mulher, supirava o cansaço de me cuidar todos os dias. E a música, como mãos que doem, parou.

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